Nos últimos meses, o Rio Araranguá, no litoral sul de Santa Catarina, tem sido palco de um fenômeno raro: o retorno dos botos-de-lahille, conhecidos por sua interação com pescadores artesanais. Esses mamíferos marinhos, que não eram avistados na região há pelo menos 20 anos, estão novamente aparecendo na foz do rio, despertando o interesse de pesquisadores e moradores locais. Recentemente, pelo menos cinco botos-de-lahille (Tursiops gephyreus) foram fotografados na área. A presença dos botos foi inicialmente notada pelos pescadores, que, com sua experiência, reconhecem o padrão de interação: quando os botos saltam na água, é sinal de que é hora de lançar a tarrafa para pescar. Osvaldo dos Passos Vieira, de 61 anos, recorda com nostalgia os dias em que ele e outros pescadores aguardavam ansiosamente pela chegada dos botos. “Eu lembro que eram 10 a 15 pescadores, só esperando o boto. Ninguém pescava. Só esperando o bichinho vir. Quando ele vinha, a gente já estava com o peixe garantido,” relembra. Com o surgimento de novos relatos sobre a presença dos botos na barra do Rio Araranguá, o pesquisador Rodrigo Machado, professor do curso de Ciências Biológicas da Universidade do Extremo Sul Catarinense (Unesc), está conduzindo estudos para entender o motivo desse retorno. Machado, que pesquisa mamíferos marinhos desde 2002, sugere que o aumento do movimento turístico em outras regiões, como Tramandaí, Torres e Laguna, possa estar forçando os botos a buscar áreas menos movimentadas, como o litoral sul de Santa Catarina. “A hipótese é que esses animais possam estar se afastando de locais mais movimentados e utilizando mais a zona costeira do Sul, resultando na sua presença aqui no Rio Araranguá,” explica Machado. No verão deste ano, o biólogo Lucas Bertoncini registrou a interação entre os botos e os pescadores em foto e vídeo, como parte de seu trabalho de conclusão de curso sob orientação de Machado. Bertoncini continua como pesquisador do projeto 'Botos do Araranguá', coordenado por Machado e com a participação de outra aluna de graduação. “A nossa ideia é colocar monitoramento sonoro debaixo da água para rastrear a entrada e saída dos botos na barra. Dessa forma, conseguiremos entender melhor seus padrões de deslocamento e suas origens, se vêm do Sul ou do Norte,” detalha Bertoncini. Além de contribuir para a pesquisa, esse monitoramento pode ajudar na proteção dos botos. Conhecendo melhor seus deslocamentos, será possível intensificar campanhas de proteção e ações de fiscalização, especialmente para evitar o uso de redes na ponta da barra e garantir a segurança desses animais.