O Ministério Público entrou com ação civil pública contra o município de Jaguaruna e o Instituto Municipal do Meio Ambiente (IMAJ) pela limitação de acesso à Lagoa do Arroio Corrente e o uso indevido de área de preservação permanente por particulares, acusando os dois réus de “tolerância, descaso e inoperância” diante da situação. O processo tramita na 2ª Vara da Comarca de Jaguaruna.
No ano passado, a 1ª Promotoria de Justiça de Jaguaruna instaurou inquérito civil para apurar a forma como o público acessa a Lagoa do Arroio Corrente e eventual ocupação da área de preservação permanente nas suas margens.
O acesso à Lagoa do Arroio Corrente se dá pela SC-442, mediante o uso de uma propriedade privada, conforme informações prestadas pelo município de Jaguaruna, por meio da Secretaria Municipal de Esporte e Turismo, ao Ministério Público. No local há uma lanchonete e a entrada é feita pelo lado do empreendimento. A lagoa conta com serviços guarda-vidas pelo Corpo de Bombeiros Militar desde 2006 e conta com estrutura de mirante desde dezembro de 2021, implementado pela prefeitura.
O MP cita que uma porteira foi instalada na área e que recebeu diversas representações no início do ano passado, noticiando que os proprietários vedavam, a partir das 20h até 8h, o acesso de qualquer pessoa ao local, em razão de fecharem a porteira dentro de tal horário. Além disso, durante o dia haviam implementado estacionamento privado mediante pagamento.
À época da polêmica, a Folha Regional noticiou que um dos proprietários do terreno afirmou que a finalidade da cobrança do estacionamento privado seria a de reverter os valores angariados para manter a lagoa limpa.
A 1ª Promotoria de Justiça de Jaguaruna requisitou ao Poder Executivo informações sobre o acesso ao local e ao Instituto Municipal do Meio Ambiente a verificação da ocupação de área de preservação permanente em razão da edificação de mirante e da lanchonete, bem como da implementação do estacionamento.
Em resposta, o município limitou-se a destacar que o acesso à Lagoa do Arroio Corrente estava garantido pela lateral da lanchonete.
“A resposta não se coaduna com o papel que o Poder Público deve desempenhar, pois o ente municipal não pode atuar na informalidade, sem qualquer ato administrativo que preconize a forma de ingresso ao bem de uso comum do povo e que deve ser calcado em intervenção legítima da propriedade, nem deve ficar refém dos particulares na implementação de horários e usos”, criticou o MP.
A promotoria afirma que precisou ajuizar a ação, “tamanha letargia do Poder Executivo de Jaguaruna e do Instituto Municipal do Meio Ambiente de Jaguaruna”. “Os entes públicos demandados, deliberadamente, afrontam as normas vigentes do direito administrativo e do direito ambiental, (…) sem qualquer indicativo de que termo de ajustamento de conduta seria adequado e suficiente, de forma a impor que cessem a omissão intolerável, adotando as providências que deveriam ter realizado de ofício.”
Área de preservação permanente
De acordo com o Ministério Público, o município de Jaguaruna, conforme lei municipal, define a área de preservação permanente no entorno da Lagoa do Arroio Corrente em 100 metros. Mas, para o MP, nem a prefeitura nem o IMAJ estariam cumprindo seu dever de garantir o acesso ao público de forma universal à Lagoa do Arroio Corrente e de proteger os recursos hídricos e o entorno, tutelando a área de preservação permanente.
“Apurou-se tanto a privatização do patrimônio natural quanto a ocupação indevida da área de preservação permanente, com total inércia e indiferença do setor público”, acusa a promotoria.
Na avaliação da área de preservação permanente, constatou-se que o mirante implementado pelo Poder Público é de baixo impacto ambiental e destina-se ao lazer, protegendo o manancial e não incorrendo em ilegalidade, segundo o MP.
Quanto à ocupação por particulares, o MP verificou que a edificação da lanchonete observou a área de preservação permanente conforme o marco legal preconizado nos anos das edificações. Os alvarás de construção são de novembro de 2012 e de ampliação de outubro de 2014, quando já estava em vigor o atual código florestal, que estabelece a faixa de 30 metros de área de preservação permanente para área urbana.
Estacionamento irregular
Com área de 1.900 m², o estacionamento “está inserido integralmente em área de preservação permanente, pois localiza-se dentro dos 100 metros das margens da Lagoa do Arroio Corrente, sem a preservação de vegetação nativa, já que há somente eucaliptos, além de não contar com licença ou autorização ambiental”, alega a promotoria.
Na ação o MP acrescenta que o IMAJ avaliou a área usando como parâmetro a faixa de 30 metros de área de preservação permanente. Mas ressalva que o próprio IMAJ tem adotado para outros empreendimentos às margens da Lagoa do Arroio Corrente, e de fins urbanos, a área de preservação permanente de 100 metros.
“A cobrança de valores no estacionamento não significa qualquer diminuição de impacto ambiental. A única diferença é que agora se lucra e o Poder Público compactou com a cobrança, permitindo que se pague para degradar o meio ambiente, pois os veículos impedem a regeneração da área de preservação permanente”, acusa.
O MP afirma que a situação cria um governo “de homens e não de leis”. “Ao não editar o ato administrativo de intervenção legítima na propriedade privada para o ingresso da coletividade na Lagoa do Arroio Corrente, o Poder Executivo de Jaguaruna tem compactuado que os particulares exerçam atividades típicas de regulamentação. Os agentes públicos toleram que pessoas privadas estabeleçam horários de ingresso, bem como digam as atividades que podem, ou não, serem realizadas no próprio bem público e cobrem valores de acesso com justificativas de taxas públicas”, destaca.
A promotoria reforça que a omissão do poder público o faz compactuar com a privatização de bem público.
MP pede condenação do IMAJ e município
Na ação civil o MP pede a condenação do município, para, no prazo de 120 dias, fazer a edição de ato administrativo que garanta o acesso público e universal à Lagoa do Arroio Corrente, indicando o local de ingresso com base em estudos dos impactos ambientais gerados, devendo abarcar inclusive o sistema viário, com a devida indicação do proprietário ou proprietários das áreas marginais.
Na sequência, no prazo de 90 dias, editar ato administrativo que regulamente a intervenção na propriedade, regulamentando os meios de uso da Lagoa do Arroio Corrente.
O Ministério Público pede também a condeção do IMAJ, para, no prazo de 15 dias, realizar a fiscalização na área de preservação permanente do imóvel, proibindo a utilização da área de preservação permanente de 100 metros das margens da Lagoa do Arroio Corrente; no mesmo prazo, notificar os proprietários a apresentarem plano de recuperação da área degradada; no prazo de 2 anos, comprovar que exigiram do proprietário a execução do plano de recuperação da área degradada, apresentando que o meio ambiente foi recuperado com a vegetação nativa.
Para cada obrigação não cumprida, está prevista multa diária de R$ 10 mil, corrigida monetariamente e com juros.